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SOPÃO, OSWALD DE ANDRADE E A SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922 / JOÃO SCORTECCI

Conheci o poeta e pintor modernista, Menotti Del Picchia (1892 1988), no final dos anos 1970. Em 1982, quando inaugurei a Scortecci Editora, na Galeria Pinheiros, na cidade de São Paulo, tive a honra de recebê-lo na loja, numa inesquecível tarde de agosto, acompanhado da escritora e acadêmica, Lygia Fagundes Telles. Entre 1982 e 1983, frequentei a casa de Menotti, na Avenida Brasil, na capital paulista. Fiquei amigo também de Helena Rudge Miller, sua enteada, filha de Charles Miller considerado por muitos o pai do futebol no Brasil  e de Antonietta Rudge, que, nos anos 1920, casara-se com Menotti. De 1934 a 1945, esse poeta e pintor modernista colaborou com o meu avô, José Scortecci, na revista PAN, e, juntos, foram inimigos de um dos maiores salafrários que este país já teve: Assis Chateaubriand. Eu, Menotti e Helena conversávamos sobre tudo: literatura, política e principalmente sobre os “causos” da Semana de Arte Moderna, realizada de 11 a 18 de fevereiro de 1922. O "Príncipe dos Poetas"  titulo que Menotti recebeu em 1982  era “fã” de Juscelino Kubitschek. Na parede da entrada da sua casa, tinha uma foto de JK. Vez por outra, interrompia o papo, apontava para a foto e bradava: “Grande homem!”. Na literatura, o assunto predileto eram as doideiras do Oswald de Andrade. Segundo Menotti, o vate antropofágico era possuído por profunda e insaciável fome. Reuniam-se  costumeiramente  nos fins de semana. Quando Oswald chegava à  casa de Menotti, abria geladeiras, armários, o saco de pão, tudo que cheirasse comida. O seu apetite era incontrolável! Helena, que participava do nosso papo, balançava a cabeça, rindo, confirmando a prosa. Para fugir dos ataques de Oswald, por sugestão de alguém, criaram o famoso “sopão literário”, com as sobras da semana. Não se perdia nada! Menotti  de quem ganhei algumas gravuras que guardo no meu acervo  pintou um retrato de Oswald de Andrade, com babador, “antropofagando” o tal “sopão literário”. O quadro a óleo  eu o vi  ficava na parede da cozinha da casa do "Príncipe dos Poetas", como prova do crime modernista. Não sei do seu paradeiro, infelizmente. Nos anos 1990, tornei-me amigo do escritor e cineasta Rudá de Andrade (Rudá Poronominare Galvão de Andrade, 1930 – 2009), filho de Oswald e Pagu (Patrícia Galvão). Contei-lhe a história e aguardei sua reação. Rudá me olhou  pareceu-me surpreso  e depois caiu no riso solto, vampiresco. Seus olhos brilharam. Nada disse. Riu muito. E a amizade continuou até sua morte. No dia 11 de janeiro de 2023, o antropofágico Oswald de Andrade estaria completando 133 anos de idade.

João Scortecci