A escritora francesa Augustine Fouillé (31.07.1833 – 08.07.1923), de pseudônimo G. Bruno (inspirado no nome do filósofo italiano) é autora de quatro manuais de leitura escolar: Francinet (1889), Les Enfants de Marcel (1887), Le tour de la France par deux enfants (1887), Le Tour de l’Europe pendant la guerre (1916). Le tour de la France..., o mais conhecido, foi utilizado para ensino de leitura, escrita, história, geografia e moral na escola primária francesa. Teve sucesso imediato e sucessivas edições com atualizações e adaptações ao sistema educacional francês. Marcou o ensino primário no contexto da Terceira República Francesa (1870-1940), foi adotado até ao anos 1950 e ainda é editado.
Nesse manual, a narrativa em forma romanceada, organizada em 121 capítulos e ilustrada com 200 gravuras, desenvolve-se em torno das aventuras vividas pelos protagonistas, André (14 anos) e Alfred (7 anos), jovens irmãos e órfãos que partem da região da Alsácia-Lorena ocupada pelos alemães depois da Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), para encontrar o tio em Marseille, cumprindo o pedido do pai antes de morrer. Durante a viagem pelas províncias francesas, aprendem a importância da educação, do trabalho, dos saberes práticos, da diversidade cultural e linguística, dos símbolos patrióticos, das formas de vida e atividades desenvolvidas no país, reconhecendo-o como nação e pátria. Por meio das lições do manual, inculcavam-se o sentimento de unidade nacional, a moral laica – em substituição à moral religiosa das edições do século XIX – o lema republicano “liberdade, igualdade e fraternidade” e noções “controversas”, tais como a que, entre as raças humanas, a branca apresentada é a mais perfeita em relação às outras.
“Este verdadeiro ‘livrinho vermelho da República’ com o seu tom paternalista promove as obsessões do novo regime: o trabalho, os valores tradicionais e o colonialismo”, na avaliação do jornalista francês Vincent Bresson. Apesar das críticas relativas às mudanças políticas e sociais, ao longo do século XX esse clássico pedagógico foi objeto de adaptações na França e em outros países – em livros, filmes, séries e programas de TV e rádio – e serviu de modelo para autores de livros escolares, como, no Brasil, ocorreu com Através do Brasil (1910), de Olavo Bilac e Manoel Bonfim – inspirado também em Cuore (1886), do italiano Edmondo De Amicis – sucesso na escola primária nas décadas iniciais do século XX, tornando-se um clássico do gênero, que formou gerações de brasileiros.
Diferentemente do filósofo italiano que inspirou seu pseudônimo, Augustine Fouillé optou, não por desafiar, mas por se engajar, ela mesma, no ideal republicano e nacionalista de sua época e propagá-lo por meio do poderoso e exemplar instrumento pedagógico que criou, no qual seu país se apresentava como a utopia de uma grande nação e no qual cada estudante deveria se engajar. Com o sucesso de seu tour da França, imortalizou-se com a inscrição de suas lições nas mentes de gerações de estudantes e de seu nome na história da educação francesa e ocidental.
Maria Mortatti