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OS TRÊS ÚLTIMOS ROMÂNTICOS INGLESES: BYRON, SHELLEY, KEATS / MARIA MORTATTI

Três poetas, George Gordon Byron (22.01.1788 – 19.04.1824), Percy Bysshe Shelley (04.08.1792 – 08.07.1822) e John Keats (31.10.1795 – 23.02.1821), marcaram a "segunda geração” do Romantismo inglês no início do século XIX. Precedidos pelos primeiros românticos ingleses, William Wordsworth e Samuel Coleridge, esses jovens poetas, com afinidades e diferenças entre suas obras e algumas rivalidades entre Byron e Keats, produziram literatura inglesa da mais alta qualidade, intensa e moderna. Em reação ao neoclassicismo – movimento artístico e cultural europeu de meados do século XVIII, com base no Iluminismo e na Antiguidade Clássica – e às regras da sociedade burguesa da época derivada das mudanças sociais e políticas da Revolução Industrial e Revolução Francesa, essa segunda geração de poetas românticos ingleses buscava a liberdade de viver e criar por meio da vida boêmia e de nova linguagem literária baseada no sentimento e no irracional, explorando temas como a melancolia, a individualidade/subjetividade, a intensidade, a natureza, o terror, a morte, o amor ideal, a beleza, o sublime, caracterizando o “mal do século”, tendência romântica ao pessimismo, melancolia, tédio, desencanto, nostalgia, resultando em tendência à morte por doença contagiosa, em especial a tuberculose, na época, ou ao suicídio.  

George Gordon Byron, Lord Byron, – considerado o nome mais influente e popular do Romantismo e cujo satanismo foi precursor do de Charles Baudelaire – escreveu os primeiros poemas quando estudante na Universidade de Cambridge. Em 1809 fez uma longa viagem por países da Europa e Oriente e, após regressar à Inglaterra, viveu de modo radicalmente livre, boêmio e apaixonado, escandalizando a sociedade inglesa com suas aventuras amorosas, e escreveu suas obras mais famosas e populares: os poemas narrativos Don Juan  (1819 – 1824) e A Childe Harold's Pilgrimage (Peregrinação de Childe Harold), os 30 poemas de  Hebrew Melodies e o poema lírico “She walks in beauty” (“Ela caminha em beleza"). Em 1824, foi lutar contra os turcos na Guerra de Independência da Grécia e, durante uma cavalgada, encharcado por uma forte chuva, teve febre e dores reumáticas, adoeceu gravemente, entrou em estado de coma e morreu no dia 19 de abril de 1824, com 36 anos de idade, durante uma violenta tempestade elétrica. Foi proclamado herói nacional da Grécia e sepultado na Inglaterra. Sua obra principal, Don Juan, foi publicada no final de sua vida, por John e HL Hunt, seus editores. Depois de sua morte, foram encontrados alguns de seus escritos comprometedores, mas, temendo que pudessem "manchar" a sua reputação, amigos do poeta atearam fogo e alguns deles foram destruídos.  

Percy Bysshe Shelley – considerado um dos mais importantes poetas românticos ingleses, cuja obra exemplifica  os extremos desse movimento literário, o êxtase alegre e o desespero taciturno, e “um poeta lírico sem rival”, para o crítico literário Harold Bloom –, como seu amigo Byron, viveu de modo livre, anticonformista e radical em sua poesia e nas posições políticas e sociais. Foi expulso da Universidade de Oxford por ter escrito o breve tratado The necessity of ateism (A necessidade do ateísmo). Devido a suas ideias céticas, idealistas e materialistas, não alcançou fama durante sua vida, mas o reconhecimento de sua obra cresceu continuamente após sua morte, e ele se tornou uma influência importante nas gerações seguintes de poetas. Além dos poemas líricos, entre os mais populares, como "Ozymandias", "Ode to the West Wind", escreveu poemas extensos, considerados seus melhores, como Prometheus Unbound (Prometeu desacorrentado)Alastor, or The Spirit of Solitude (Alastor ou O espírito da solidão), "Adonaïs", e o inacabado The triumph of life (O triunfo da vida). Também escreveu o ensaio “A defense of poetry” ("Uma defesa da poesia") e romances góticos. Após o sucídio da primeira esposa, casou-se com a romancista Mary Shelley e era amigo de John Keats e Lord Byron. Para este, durante um passeio de barco, Shelley escreveu o poema “Hymn to intellectual beauty" ("Hino à beleza intelectual”), publicado em 1816. Morreu no dia 8 de julho de 1822, aos 29 anos de idade, vítima de um naufrágio, ao lado do amigo Edward Williams. Em cerimônia presidida por Lord Byron, Shelley foi cremado na praia de Viarregio, na Itália, onde seu cadáver foi encontrado. Seu coração foi doado a Mary Shelley, pelo romancista Trelawney. Quando ela morreu, o coração de Shelley foi sepultado junto à escritora.

John Keats – também considerado um dos mais importante poetas românticos ingleses´– foi  o último e o mais jovem a morrer. Estudou medicina, mas abandonou o curso para se dedicar à poesia. Embora não tivesse educação literária formal, conhecendo o momento histórico e literário em que viveu, Keats escreveu com extrema rapidez em diferentes formas poéticas e em rico estilo, comparável para muitos críticos com os sonetos de Shakespeare. Publicou apenas 54 poemas, em três pequenos volumes e algumas revistas, que não foram bem recebidos pela crítica, durante sua vida, mas exerceram influência em diversos poetas posteriores, como  Alfred Tennyson e Wilfred Owen. Seu primeiro livro, Poems, foi publicado em 1816 – quatro anos antes de morrer – e, em 1818, o longo poema “Endimyon”, seguido de “Hyperion” e “The eve of St. Agnes” (1919), em 1920, os poemas “Isabella” e “Lamia” e continuou escrevendo famosos sonetos, odes e cartas. Em 1818, conheceu Fanny Brawne, a grande paixão de sua vida com quem teve um relacionamento amoroso que não culminou em casamento, como ele desejava. Em 1820, para se curar de tuberculose que contraíra quando cuidava de seu irmão com essa doença, foi para a Itália, por recomendação médica, mas lá morreu pouco tempo depois, sem reencontrar a amada. Foi sepultado em Roma, e sobre seu túmulo foi esculpida a inscrição que ele mesmo redigira: “Here lies one whose name was writ in water” (“Aqui descansa um homem cujo nome foi escrito sobre a água”). Em sua memória, Shelley escreveu o poema "Adonaïs".

Os três últimos e mais prolíficos poetas do Romantismo inglês se tornaram “canônicos”, suscitando interpretações quase míticas. Apesar das rivalidades, ao final reconheceram as qualidades um do outro, e, em suas breves vidas, compuseram obras extensas e duradouras, lidas, imitadas, traduzidas e estudadas, com notável influência em gerações seguintes de escritores europeus e também de poetas brasileiros da "segunda geração" do Romantismo no Brasil, como Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Junqueira Freire e Fagundes Varela, cujas vidas e obras são marcadas pela triste tradição herdada daqueles: o “mal do século”. Byron morreu com 36 anos, Shelley, com 29 anos e Keats com 25 anos de idade. Apesar de suas breves vidas, às obras que legaram cabe exemplarmente um de meus versos preferidos do "Endymion", de Keats: "A thing of beauty is a joy for ever:/Its loveliness increases; it will never/Pass into nothingness; (...) ("Tudo o que é belo é uma alegria para sempre:/O seu encanto cresce; não cairá no nada;(...) " (Tradução de Péricles E. S. Ramos)

Maria Mortatti  – 09.09.2023