Pesquisar

JOSEPH JACOBS, PIONEIRO DOS CONTOS DE FADAS INGLESES / MARIA MORTATTI

Who says that English folk have no fairy tales of their own?” (“Quem diz que o folclore inglês não tem seus próprios contos de fadas?”), é a provocação inicial no prefácio ao livro English fairy tales (1890), do folclorista, editor, escritor, tradutor, crítico literário, cientista social e historiador Joseph Jacobs (29.08.1854 – 30.01.1916). De família judia, nascido em Sidney, Austrália, morou e estudou em Londres, Inglaterra, e em Berlim, Alemanha, época em que começou a se interessar pela carreira literária e folclorística. Retornou a Londres, onde morou e trabalhou até 1900, quando se mudou, com a esposa, Georgina Horne, e seus filhos, para Nova York, Estados Unidos da América, tornou-se cidadão norte-americano e lá morreu de doença cardíaca.

Pensador e escritor versátil, Jacobs se notabilizou por seus estudos judaicos e bíblicos e pela compilação e edição de fábulas, contos populares e contos de fadas, além da tradução e da edição de clássicos literários. Em Londres, foi membro do comitê do Conselho de Deputados dos judeus britânicos por vários anos, atuou como secretário da Sociedade de Literatura Hebraica, escreveu artigos sobre a perseguição dos judeus na Rússia, publicados em The Times, em 1882, e produziu, com o jornalista inglês Lucien Wolf, a Bibliotheca Anglo-Judaica. Nos Estados Unidos da América, atuou como editor e colaborador de The Jewish Encyclopedia, da revista American Hebrew (1906 – 1916) e da obra Jewish Contributions to Civilisation – An Estimate (1919). 

Na Inglaterra, integrou The Folklore Society, e, entre 1899 e 1900, editou a revista Folklore. Entre 1888 e 1916, compilou e editou livros de fábulas de Bidpai – brâmane lendário a quem se atribui a redação de antigos apólogos indianos, originados do Panchatantra –, de fábulas de Esopo – escravo e contador de histórias da Gécia Antiga –, de contos populares ingleses e contos de fadas ingleses, celtas, indianos, judaicos e europeus, além de livro de viagens imaginárias. Editou, ainda, clássicos, como As mil e uma noites (6 v., 1896). Como estudioso do folclore inglês, pesquisou e coletou histórias da tradição popular e, inspirado nos escritores alemães Jacob Grimm (04.01.1875 – 20.09.1863) e Wilhelm Grimm (24.02.1786 – 16 .12.1859) e no nacionalismo romântico comum em folcloristas na época, Jacobs desejava que as crianças inglesas tivessem acesso aos contos de fadas ingleses, além dos contos franceses de Charles Perrault (12.01.1628 – 16.05.1703). Justificando seu trabalho – que não se restringiu a compilar, mas por vezes, reescreveu alguns trechos –, Jacobs afirmava: 

Os contos de fadas da Inglaterra são tratados como madrastas. Que eles já existiram em números toleráveis, ainda existem vestígios (...). Mas em meados do século [XVIII] o gênio de Charles Perrault cativava as crianças inglesas e escocesas com tanta força ou, provavelmente, ainda mais força do que havia encantado as francesas. (...) A elegância e clareza superiores dos contos franceses substituíram o vigor rude dos contos ingleses. O que Perrault começou, os Grimm completaram. (...) e o conto de fadas inglês tornou-se uma mistura confusa de Perrault e os Grimm.

Em 19.06.1890, Jacobs lançou English fairy tales, que teve continuidade em More English fairy tales, de 1893. Ele mesmo afirma, porém, que, embora tenha reunido muitos contos sob a denominação “contos de fadas”, dos 87 textos dos dois volumes, apenas 38 são propriamente contos de fadas; os demais são: “dez sagas ou lendas, dezenove piadas, quatro histórias cumulativas, seis contos de bestas e dez histórias non sense.” Nesses livros, Jacobs popularizou algumas das versões mais conhecidas, traduzidas e adaptadas de contos de fadas ingleses. No volume de 1890, por exemplo, estão reunidos contos famosos, como: "Jack and the beanstalk" (“João e o pé de feijão”), "Goldilocks and the three bears" (“Cachinhos Dourados e os três ursos"), "Jack the giant killer" ("João, o matador de gigantes”), "The history of Tom Thumb" (“A história do Pequeno Polegar”) e “The three little pigs" (Os três porquinhos”). Este conto é um dos mais icônicos e já era conhecida na Inglaterra, na versão mais antiga, publicada em 1853 – cujos personagens eram três duendes e uma raposa, em vez dos três porquinhos e um lobo – e na versão de James Halliwell-Phillipps (1820 – 1889), incluída em seu livro The Nursery Rhymes of England (c.1886), fonte para a de Jacobs, que, com uma linguagem clara e dirigida ao público infantil, tornou-se a mais popular e tornou o compilador um dos mais populares escritores de contos de fadas da língua inglesa. 

Durante a vida, Jacobs foi considerado um dos maiores especialistas em folclore inglês e, apesar de suas relevantes contribuições em outras atividades, é lembrado principalmente como "a principal autoridade em contos de fadas e recriação de fábulas". Quem disse que o folclore inglês não tem seus próprios contos de fadas? Quem disse que entre os clássicos da literatura infantil, além de Perrault, os Grimm e Andersen, não está Jacobs? 

Maria Mortatti